sábado, 28 de novembro de 2009

A Visita

A sala estava cuidadosamente arrumada. Os cristais foram limpos e os livros e quadros alinhados com paciência e esmero. A percepção do tempo se desfez por várias horas. Ora Chopin, ora Beethoven preenchiam todos os espaços e os deixavam limpos também. Às vezes era possível esboçar um sorriso gostoso vendo os passarinhos pousando na janela e dando rasantes no jardim.

A campainha soou. Quem seria? Ele ou ela? Ao abrir a porta um esguio corpo portava um lindo traje de linho branco. Serviu-se a refeição com serviço completo enquanto um Château Lafitte emoldurava emoções não esboçadas. Nenhuma palavra interrompeu os Noturnos e as Sonatas. Ambos sabiam que o tempo estava voltando a fazer diferença. Nada mais a esperar.

A porta ficou entreaberta. Sobre o tapete estendia-se aquele para o qual o tempo não mais fazia diferença. Gymnopedie ainda enchia a sala e os passarinhos ainda continuavam pousando na janela.


Mano Jone


Ouça Gymnopedie Nº 1:

domingo, 22 de novembro de 2009

Tempo vão

Dentre seus pertences um índio do Forte Apache, uma latinha com parafusos e elásticos, três Matchbox, um caderno cheio de rabiscos, um peão, uma fieira, cópias em carbono do jornalzinho datilografado e um jipinho bate-e-volta da Polícia.

Ao olhar pela janela, uma lágrima da infância não lhe tirou o olhar fixo para o nada. O que fizera esse tempo todo? De um tempo feliz para perguntas sem resposta. Bing Crosby e Grace Kelly cantam "True Love". Em qual esquina perdera o passo? Ou com quem? Ou por quem?

A campainha tocou e rapidamente tudo voltou para a velha caixa de madeira. Até quando?


Mano Jone

sábado, 14 de novembro de 2009

Voando

Com uma expressão no rosto entre alegre e fria, abriu a janela e voou.

Mano Jone

Esperança

Hoje ao sair de casa vi algo comum e que se revelou inédito para mim. Vi, do outro lado rua, um menino tocando a campainha de uma casa. Pensei que fosse a repetição do pedinte infantil. Tudo mudou quando a voz perguntou pelo interfone o que ele queria. Daí minha surpresa! O menino, de uns 11 ou 12 anos, perguntou se havia um emprego para ele. Diante do "não" vindo do interfone, o menino agradeceu e foi em frente. Apertou o passo para falar com um morador da casa vizinha. Fez a mesma pergunta e recebeu o mesmo "não". Quantos seriam a essa altura? Quantos mais ele poderá resistir?

Mano Jone

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Culpa

A culpa regula a sociedade e a mantém com alguma civilidade.

Mano Jone

terça-feira, 19 de maio de 2009

Dúvidas

Quanto mais respostas procuro, mais perguntas encontro.

Mano Jone

Espelho

Desista de entender as pessoas. Por maior seja seu arquivo sobre o comportamento humano, surgirá uma pessoa nova que, por algum motivo, fugirá à sua compreensão. Mesmo que você, num grande salto, compreendê-la, aparecerá outra. Até que, num dia inesperado, nos defrontamos com a mais desconhecida de todas as pessoas: nós mesmos.

Mano Jone

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Pessoas e Músicas

Pessoas são únicas, mesmo pertencentes a um mesmo grupo ou classificação. Pessoas são como músicas, resultado da infinita combinação de sons e emoções. Nem sempre esse arranjo resulta em uma coisa boa.

São muitas as músicas ruins em todos os aspectos. Tem sempre quem goste. Assim como as pessoas. Muitas músicas podem melhorar quando agraciadas por um bom arranjo. Basta que outra pessoa olhe o que há de bom, olhe a essência e valorize o que não está visível ou está adormecido. Isso é o amor que vem do outro. O encontro de ambos, música e arranjador, resulta na evolução, resultado do amor.

Mano Jone

Seja Paciente

Quero lhe implorar
Para que seja paciente
Com tudo o que não está resolvido em seu coração e tente amar.
As perguntas como quartos trancados e como livros escritos em língua estrangeira.

Não procure respostas que não podem ser dadas porque não seria capaz de vivê-las. E a questão é viver tudo. Viva as perguntas agora.

Talvez assim, gradualmente, você sem perceber, viverá a resposta num dia distante.


Rainer Maria Rilke

Ouça a livre interpretação de Antônio Abujamra: http://www2.tvcultura.com.br/provocacoes/poesia.asp?poesiaid=558

domingo, 17 de maio de 2009

A culpa é de São Pedro

É impressionante como as cidades brasileiras não estão preparadas e nunca são preparadas para as chuvas. Qualquer chuva. Mudanças climáticas, El Niño, El Niña à parte, quando chove o caos se instala. Todo ano é a mesma coisa. Choveu, caem casas, morre gente, ruas alagadas, mobilização popular para ajudar desabrigados. Todos reclamam, ficam indignados, contam prejúizos. Estradas já esburacadas durante as quatro estações, desabam. Pontes são levadas por rios. As ruas urbanas esburacam de vez. Os buracos que nos acostumamos a desviar se transformam em crateras, verdadeiras armadilhas onde todos caímos pelo menos uma vez. O ideal será tirar a carteira de habilitação na Lua. Motoristas de ônibus com curso na NASA. Carros anfíbios. Aliás as ruas foram invadidas por utilitários (antes apenas "pick-ups") para enfrentar as trilhas instaladas no lugar das vias.


Basta parar de chover e tudo vai por água a baixo na memória. É como se aceitássemos esse fato como algo inevitável. Mas é. Eu seria capaz de apostar como tem gente ganhando dinheiro com essa falta de planejamento. Ou melhor, deve haver aqueles que projetam seus fluxos de caixa contando com a chuva do ano que vem. As chamadas operações "tapa-buracos" são verdadeiras piadas de mau gosto. Após uma cratera fazer muitas e muitas vítimas, aparece um caminhão todo sujo e joga uma pasta, que até asfalto deve ter. Mas é asfalto frio e no próximo ônibus ele rebaixa para depois ser arrancado por algum outro. Todos vêem a ridícula espessura da pista. Óbvio que não vai durar muito. Mas é óbvio que não deve interessar ao poder público que esse asfalto dure. Afinal, tem aquela história de fluxo de caixa projetado... Tapar buraco é um excelente negócio.

Mano Jone