quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

O lucro que mata.

Anderson saiu de casa cedo e enfrentou duas horas de um ônibus péssimo para chegar até a morte.  Trabalhador de uma obra num bairro "nobre" de Salvador, o operário fez o que sempre faz um peão: trabalha duro e a qualquer custo.  Na placa do empreendimento, a propaganda diz que o "Itaigara vai ficar ainda mais charmoso."
Lá pelas onze horas da manhã, uma parede caiu em cima de Anderson e ele morreu.  O evitável aconteceu.  O prédio em que o operário trabalhava não segue nenhuma norma de segurança.  Segue apenas as normas da ganância de algum desprezível empresário, que para obter algum mísero lucro a mais, ignora a vida.  Gente que só consegue olhar o próprio umbigo inchado de lucro podre obtido às custas do trabalho semi-escravo.  Gente que tem certeza de que o sucesso de tudo está em ter mais dinheiro.  Não há como conversar com esse tipo de gente.  Não há diálogo com aquele que faz qualquer coisa por um lucrinho, pois ele corre atrás da satisfação da sua vaidade, das suas fraquezas, da sua ignorância.  O jornal diz que tentou falar com a "assessoria do empreendimento", mas não obteve resposta.  Provavelmente, estão consultando os advogados para que não haja punições aos proprietários.  

A imprensa chegou quase mais rápido do que o SAMU e depois de trinta minutos havia um helicóptero mostrando imagens "ao vivo" para a porcaria do telejornal local.  Onde estavam o CREA, a Prefeitura e os Sindicatos?  Todos pensando em como aumentar as taxas de seus "associados".  Ficam todos calados na certeza de que a morte de um "simples" peão vai ser esquecida ou apenas usada como estatística por alguma entidade de classe para pedir "melhores condições de trabalho".

Amanhã apenas a família lembrará de Anderson.  Amanhã o empresário vai procurar saber como liberar a obra o mais rápido possível.  Amanhã os advogados estarão com as palavras prontas para justificar o injustificável e salvar a pele do cliente.  Amanhã a imprensa se ocupará de outra morte, alimento de todo tipo de urubus.  Amanhã todos nós esqueceremos dessa morte, pois tudo isso passou a ser normal, fato da vida.  No máximo, nos indignamos dizendo "É um absurdo", mas também não fazemos nada.  A indignação só aparece quando atinge um dos nossos.  Os outros que se danem.  É assim que o capitalismo nos transforma em indivíduos sem sentimento e amor ao próximo.  Somos apenas um objeto a ser manipulado e alienado para comprar e dar lucro.  Oxalá chegue o dia em que o materialismo morra e nós nem lembremos dele no dia seguinte.

Mano Jone

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Pequenos Golpes II - Guia Turístico em São Cristóvão - SE

Isso se passou na bela cidade de São Cristóvão em Sergipe no final de 2012.  Atraído pelos apelos históricos fui conhecer a primeira capital do estado e a quarta cidade fundada no país.  Fica bem perto de Aracaju, cerca de 25 quilômetros, com acesso fácil, mas, para variar, com pouca sinalização.

Ao chegar no centro da cidade se vê a semelhança com Salvador ou Lisboa.  As igrejas portuguesas estão no paço principal.  A Igreja Matriz foi construída para os brancos.  A Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, só para negros.  Por fim, para o apartheid ser completo, foi construída a Igreja de Nossa Senhora dos Pardos.  A mensagem não podia ser mais objetiva: cada um no seu quadrado. Há, ainda, o terceiro maior museu de arte sacra do Brasil, com 500 peças doadas ou emprestadas.  São obras interessantes e que vale a pena ver.  As igrejas também são interessantes.  Na praça do Cruzeiro também está localizada o convento onde Irmã Dulce fez seus votos e adotou o nome de Dulce (em homenagem à irmã dela).  Enfim, para quem gosta, é possível ver belas igrejas numa cidade que mantem a cultura regional com festas, Reisados  Folguedos,  Bacamarteiros e outras manifestações que devem ser preservadas.

Onde está o problema?  Com a cidade, nenhum.  O golpe fica por conta de alguns desocupados que se ocupam de pegar o seu dinheiro em troca de um serviço desnecessário.  O turista chega e é cooptado por um desses "especialistas".  Naturalmente, por algum trocado, qualquer um quer contratar alguém para indicar e falar sobre as coisas da cidade, das igrejas e o que ocorrer.  Fiz isso para ganhar tempo e conhecimento e entrei pelo cano.  O tal "guia" foi muito simpático e me levou para a primeira igreja da tarde.   Antes ele fez uma relação de igrejas, mas aconselhou o roteiro.  Ao entrar na igreja havia uma guia da própria prefeitura, que dava todas as informações sobre aquela igreja e de graça.  Enquanto isso, o guia disse que ia pedir para Dona Miriam para abrir a casa para vermos seu famoso presépio.  Lembrei de Gabriela, Cravo e Canela e o presépio montado pelas duas irmãs solteironas e megeras.  De repente, aparece o guia.  Impressiona como ela sabe o tempo que vai durar a visitação na igreja.  Dali, seguimos para a casa da simpática Dona Miriam, que todos os anos faz um presépio diferente, digamos, temático.  Muita conversa "de interior" e o guia sentado na sala de estar da senhora de 92 anos (segundo o guia, mas eu achei que uns 72 tava bem dado).  Na saída, uma ingênua caixinha de papelão pedia uma ajuda para manter o presépio.  Diante de tanto calor humano, achei justo colocar R$20,00 (+/- US$10.00) naquela caixa.  O guia, preguiçoso, não queria mais sair do sofá.  Eu calmamente pensando que tudo está equacionado na cabeça do experiente guia.  E estava, mas para ele, não para mim!  Saímos dali e fui levado para o convento onde Irmã Dulce fez os votos.  Na entrada, uma pequena cantina, que o guia recomendou fortemente que eu consumisse algo lá.  O guia me largou na frente da igreja e pediu para um outro não-sei-quem me explicar "as coisas".  Esse último ficou comigo uns bons 3 minutos e "me deixou à vontade".  Traduzindo: o sujeito me largou no meio de uma igreja sem me explicar nada e foi atender aos fregueses que queriam sorvete no balcão.  Olhei um pouco para cima, um pouco para o lado, andei um pouco e acabei tomando um sorvete.  Quando coloquei o pé na rua o guia surge do nada.  Na prática o descarado estava sentado no pé de uma árvore esperando o otário sair da igreja.  Ainda deu para notar uma argola presa ao lado da porta da igreja, onde se amarravam escravos rebeldes.  Ah! santa igreja...  O guia logo me levou para o próximo ponto turístico imperdível, que fica a uns cinquenta metros da igreja que saí.  Aliás, tudo fica em volta da mesma praça.  O atento guia me levou até a porta da Igreja de São Francisco, onde fui recepcionado por outra guia da prefeitura, que me explicou tudo em detalhes e de graça.  Ao colocar o pé fora da igreja, quem estava lá me esperando?  O guia.  Ele me levou até o museu de arte sacra.  Talvez eu não conseguisse sair de uma porta andar 15 metros e entrar em outra porta.  No museu, uma pequena taxa, ganhei um livro e fui acompanhado por uma guia.  Bem, no meio apareceu um grupo, ela me largou falando sozinho e um sujeito preguiçoso veio com o mesmo papo furado de "me deixar à vontade".  Eu disse a ele que não queria ficar à vontade sozinho, mas ele tinha de vir comigo me explicar aquela enormidade de peças e detalhes.  A contragosto o preguiçoso veio.  Bem, saí do museu e apareceu o guia.  Pedi para ir até a igreja matriz.  O vagabundo me disse que a igreja fechava às quatro horas.  Já eram quatro horas.  Entrei no carro e voei para ver se achava alguma igreja aberta.  Todas fechadas.  O descarado do guia estava no meu carro quando eu descasquei minha raiva em cima dele.  Larguei ela na praça e ainda dei R$15,00, porque nunca se sabe se uma pedra ou sei lá o que pode vir atrás de um descontentamento de um guia vagabundo.

Conclusão: fui enganado por um preguiçoso, descarado e vagabundo que tem participação na caixinha do presépio cafona de Dona Miriam e no barzinho-inho-inho da igreja.  Ele me atrapalhou e acabei sem ver a igreja matriz e a dos "pardos".  Você que vai para aquela bela cidade, faça um favor a si mesmo: faça tudo sozinho.  Recuse veementemente qualquer ajuda, pois é absolutamente desnecessária.

Mano Jone

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Pequenos Golpes I – Posto de Gasolina

O motorista necessitado leva seu carro para encher o tanque. Enquanto o incauto motorista aguarda, o simpático frentista pede para “ver a frente” ou, num gesto de generosidade e profissionalismo ele quase lhe ordena: “abra a frente para eu colocar a água do vidro”. Quem recusaria tamanha gentileza e preocupação gratuita? O satisfeito motorista relaxa, enquanto o frentista coloca a tal água e, ainda mais preocupado, vai verificar o nível do óleo. Ele deixa o capô do seu carro aberto e vem lhe informar, quase como um lamento, que “o óleo tá baixo”. O motorista, agora preocupado, consente que seja colocado óleo para salvar seu carro. Afinal, se não fizer isso pode ter um prejuízo ainda maior. O motorista contente paga o combustível e o óleo e sai aliviado.

Na verdade o frentista quebrou sua resistência ao ser gentil e conseguiu que o motorista abrisse feliz o capô do veículo. O que o frentista queria não era lhe ajudar em nada, mas aplicar o famoso golpe do óleo. Sempre que se mede o nível do óleo com o motor quente, ele estará abaixo do nível, pois o óleo está espalhado pelo motor fazendo seu papel de lubrificante. Óleo se mede com o motor frio e num terreno plano. Enfim, o golpe é simples e dado centenas de vezes por dia em todo o país. Como o nível estará baixo, o frentista, que ganha comissão por vender o óleo, vai lhe sugerir uns 2 litros. O excesso será queimado pelo motor e pode até sai uma fumacinha branca pelo escapamento. O óleo deve ser trocado periodicamente e não apenas ser “completando”.

O frentista lhe engana, lhe aplica um golpe de “esperteza”. Assim como tantos outros que se apresentam gentis e solícitos para enganar e pegar o seu dinheiro.
Mano Jone