quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Um Golpe do Destino (The Doctor): Uma visão Psicológica


Um Golpe do Destino (The Doctor) é a história do médico Dr. Jack McKee, cirurgião competente, mas que vê as pessoas como máquinas e seu trabalho como de um reparador delas.  O próprio McKee ensina aos médicos residentes que o necessário a ser feito em relação a uma cirurgia é “abrir, consertar e fechar”.  Na primeira cena do filme se vê um procedimento cirúrgico na sala de cirurgias com música e muita conversa.  A despeito da competência de toda equipe, o paciente não é encarado como um ser humano, apenas como u’a máquina danificada.  O médico fica muito distante do paciente, de seu problema, de sua história de vida.  O foco é a cirurgia e o “conserto” do defeito.  Em certa medida, creio que há eficácia no método, visto que o paciente foi submetido a uma cirurgia realizada por um cirurgião competente que, de fato, fez o certo.  O problema está na distância entre o médico e o ser humano do outro lado.  Tema similar vem sendo tratado na série de TV “House”, onde o que importa para o médico protagonista é a solução de um problema enigmático, nada importando quem é ou o que sente o paciente.  Somos complacentes nesses casos, pois o final é feliz com a solução do problema, mas se pode aferir que todo o processo seja menos penoso e com maior adesão ao tratamento nos casos em que há a aproximação entre equipe médica e paciente de forma mais humana e menos técnica.

Golpe do Destino mostra de forma clara as consequências de uma sociedade capitalista e individualista.  Cada qual preocupado consigo próprio.  O “outro” é algo existente para ser usado como uma ferramenta.  Uma sociedade onde os méritos estão relacionados com a produção e com ser produtivo.  A dinâmica de produzir resultados leva ao distanciamento entre a sensibilidade, a compaixão, o amor e o fato diário: reduzir custos, aumentar lucros e ter sucesso.  Isso tudo de forma individualista.  O médico do filme tem uma família que comemora quando ele está presente numa noite na semana.  A distância entre pai e filho traz uma criança que não ouve o pai numa conversa corriqueira, porque também tem tempos e tarefas a cumprir.  A relação com a esposa é, a primeira vista, de muita ligação, mas a ela importa como ela vai estar diante dos problemas.  E exatamente esse distanciamento é a marca do Dr. McKee, que relaxa com brincadeiras tanto na sala de cirurgia, quanto fora.  O momento em que ele se vê diante de um câncer ainda não é suficiente para que haja o entendimento de que há, pelo menos, dois lados: paciente e médico.  A princípio o médico doente é tratado por uma sua colega, tão mais fria e distante quanto ele.  Uma médica mecanicista, rude e grosseira, que ignora qualquer tipo de contato mais afetuoso, tratando sempre da doença e nunca do paciente.

Dr. McKee passa a ser paciente, mas quer manter os privilégios de ser um cirurgião conceituado no mesmo hospital.  A sociedade na América do Norte, em relação à nossa, é mais distante em seus relacionamentos, traço cultural de sua origem, o que faz as pessoas sentirem falta de mais afeto apenas quando suas vidas estão em risco.  Esse contraste fica claro quando Dr. McKee conduz o tratamento de um paciente (de origem latina) que necessita de transplante de coração.  Ele agradece e confia no médico e lhe dá um abraço, algo muito estranho para os americanos do norte.  Voltando, o médico doente, agora paciente, se vê às voltas com toda a burocracia do hospital e com a frieza de alguns atendentes.  Passa por erros de procedimentos quando é submetido a uma desnecessária lavagem intestinal.  Sua médica pede desculpas.  Ele mesmo conclui que a expressão “sinto muito” deveria ser abolida, pois tudo se explicava assim sem maiores consequências.  O médico passa a perceber o sofrimento de cada um e o seu próprio.  A angústia da morte iminente em sua nova amiga, que tendo um tumor na cabeça luta contra o tempo.  Ele vê pacientes que morrem e outros que na fila da quimioterapia recebem a notícia e se colocam na mesma posição.  Sua percepção do que seja um contato humano muda completamente e ele passa a entender a importância de uma relação paciente-médico muito mais próxima, encarando o paciente como um ser humano e não como u’a máquina com defeito.  Uma revelação contundente se dá quando sua nova amiga lhe fala que os médicos levaram três meses para diagnosticar seu tumor cerebral.  Dr. McKee, em outro momento, explica que se tivesse feito uma tomografia computadorizada seria possível diagnosticar seu problema, mas são as seguradoras, os planos de saúde, que definem quais exames podem ser feitos, pois o tal exame custaria mil dólares.  E assim temos um quadro onde de um lado há o poder

Os relacionamentos interpessoais do médico protagonista são utilitaristas.  Sua esposa fica magoada ao saber que ele partiu em viagem com sua amiga.  No dia seguinte, ela o encontra e diz: “você está acabando comigo”.  A sociedade individualista se mostra ali de forma crua e cruel.  O filho não tem a referência paterna como alguém próximo e quase não sorri, sempre com a expressão triste.  Seu grande amigo médico pede que ele testemunhe em um caso judicial, mas esconde que havia adulterado fichas e laudos médicos para encobrir um erro.  Todas essas relações passam a ser questionadas e começam a ser vistas com outra lente pelo Dr. McKee.  Sua experiência direta com a realidade dos pacientes o faz perder a arrogância e enxergar o dia-a-dia de quem sofre e precisa de tratamento médico.  Ele encontra na nova amiga June a compreensão de quem também tem uma doença grave.

Dr. McKee passa a ver pessoas onde havia números e doenças.  Ele passa a exigir de seus residentes que saibam o nome de quem está sendo avaliado.  Ele não admite mais que um paciente seja classificado como “terminal”, admitindo somente que o paciente esteja vivo ou morto.  E enquanto vivo merecedor de todos os cuidados destinados ao ser humano.

CONCLUSÃO
Numa sociedade capitalista a equipe médica, o paciente e o hospital não são as únicas variáveis envolvidas.  Há o braço frio das seguradoras, dos planos de saúde, que remuneram mal as consultas médicas e restringe exames caros.  Tudo em nome do lucro.  Não importa quem é o paciente, pois esse é apenas um número que deve ser trabalhado pelas estatísticas no intuito de se reduzir custos.  O médico, de forma generalizada, participa dessa roda-vida e vai, pouco a pouco, se desumanizando, se distanciando do ser humano que é e do que está sendo tratado.  O filme nos mostra todos esses lados.  As tintas são ainda mais fortes, pois a história se passa nos EUA, onde o capitalismo tem seu domínio absoluto e, ainda, numa sociedade extremamente individualista onde o outro só interessa como um meio para se atingir algum objetivo.  Os exemplos no filme vão desde o próprio Dr. McKee, passando por sua esposa, seu amigo médico e pela médica que o avaliou.  Exatamente o médico mais criticado pelo grupo do Dr, McKee, chamado por eles de Rabino, é o que apresenta o contato mais humano com os pacientes.  A ele o Dr. McKee confia sua cirurgia sendo amplamente acolhido pela equipe.  Dr. McKee se recupera e começa a reconstruir os significados à sua volta, numa nova relação com os pacientes, com a esposa e com o filho, a partir de uma nova relação sua com o mundo.  O Psicólogo pode ter um papel importante ao fazer essa mediação entre os diversos agentes envolvidos, buscando maior entendimento entre as partes, resultando, ainda, na maior adesão ao tratamento.

BIBLIOGRAFIA
UM GOLPE DO DESTINO. Filme. Título original: The Doctor. Direção : Randa Haines. Duração: 122 m. Gênero: drama. EUA. 1991.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Poema em Linha Reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Ato falho

O ato falho é quando alguma coisa "escapa" do inconsciente para o consciente sem que se perceba.  Pode gerar uma bela saia justa.  Creio que o maior ato falho possível é quando alguém vai dizer "ato falho", mas diz "ato falo".  Se for tentar explicar piora.


Mano Jone

sábado, 8 de janeiro de 2011

O momento certo

Muitas vezes não é fácil ter de aguardar o momento certo para tomar uma atitude.  Na jornada da vida as pessoas são expostas a situações às quais, por vários motivos, não podem reagir.  Esse imobilismo é, quase sempre, mal interpretado por aqueles que tudo sabem, tudo julgam, tudo condenam.

Manter o foco numa imagem que faz mal à nossa alma não é tarefa fácil.  Sofrer calado aguardando pelo momento em que as coisas farão sentido e serão entendidas, também não é nada fácil.  "Quando o carnaval chegar" de Chico Buarque é um resumo disso tudo.  Apesar das adversidades é preciso ter paciência e fé sempre, principalmente quando se espera pela justiça.


Mano Jone


Quando o carnaval chegar
Chico Buarque
1972

Quem me vê sempre parado, distante
Garante que eu não sei sambar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

Eu tô só vendo, sabendo, sentindo, escutando
E não posso falar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

Eu vejo as pernas de louça da moça que passa e não posso pegar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

Há quanto tempo desejo seu beijo
Molhado de maracujá
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

E quem me ofende, humilhando, pisando, pensando
Que eu vou aturar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

E quem me vê apanhando da vida duvida que eu vá revidar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

Eu vejo a barra do dia surgindo, pedindo pra gente cantar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

Eu tenho tanta alegria, adiada, abafada, quem dera gritar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

http://www.chicobuarque.com.br/construcao/mestre.asp?pg=quandooc.htm

sábado, 1 de janeiro de 2011

2011

A cada ano novo surge sempre a esperança de que ele seja melhor.  Pedimos, oramos, suplicamos e, por um momento, ficamos em contato direto com o divino.  É um sentimento de plenitude que nos enche o espírito de alegria.  Por que não coseguimos eternizar esse momento?  Só depende de cada de um de nós.

Mano Jone